quarta-feira, 25 de março de 2009

limites rígidos

Coisas da década de 1981 a 1990. Nessa época eu estava na mais do que tenra idade de 8 primaveras. O meu grupo escolar, num rompante de sagacidade cultural, levou a minha turma para algo completamente diferente. Fomos fazer uma visita domiciliar a um dos grandes baluartes da literatura brasileira.

Nossa tia (como chamávamos a professora) recomendou que levássemos gravadores, para que depois fizéssemos um trabalho valendo nota. É sempre assim, não é? Depois que a tia (que não é nem nunca foi irmã da minha mãe ou do meu pai)botou ordem nas suas ferinhas, todas com os shortinhos tão em voga naquela época, naquela agitação infantil de praxe, começamos a, digamos assim, entrevista coletiva. Logicamente que não vou me lembrar agora de quem fez qual pergunta, e nem vou me lembrar de tudo o que foi perguntado. Mas vamos seguir com os trechos que a minha memória permite repassar para vocês:

Q:COMO É ESSA VIDA DE PROFISSIONAL DAS LETRAS, ARTESÃO DE SIGNOS?

A: Olha, por mais clichée que possa parecer, eu tenho que dizer isso. Não tem jeito. É uma coisa mágica, sabe? Num momento estou diante de uma celulóide em branco, e como que num estalo essa mesma folha está completamente preenchida. Com um oceano de letras. E outra coisa muito interessante a se ressaltar, a título de apendice, é essa coisa que a literatura de uma forma geral (tanto em prosa quanto em verso) nos permite, que é essa possibilidade de jogar com a ficção e a realidade. Misturar esses dois mundos num mesmo parágrafo, numa mesma frase.

Q: NA DÉCADA PASSADA TIVEMOS UM PROBLEMA SERIÍSSIMO COM OS CENSORES, NOS PORÕES DA DITADURA. VOCÊ FOI MUITO "TESOURADO" NESSE PERÍODO?

A: Olha, não fui pouco tesourado não. Me surpreende que vocês não precisem de uma lupa para me enxergar, de tão multilado e diminuído que eu fui (risos, só por parte do autor da sentença). Mas, agora falando sério agora, bota aí que de cada vinte crônicas/romances que eu escrevia, uns 2 ou 3 chegavam às ruas. E mesmo assim totalmente adulterados. Foi uma violência que acho que só quem passou por isso pode ter idéia da dor que foi.

Q: "DIRETAS JÁ" É O BRASIL QUE VAI PRA FRENTE?

A: Talvez seja cedo pra esbanjarmos tanta alegria. Esperança, é claro que é preciso ter.Mas só o tempo vai nos dizer o que realmente vai acontecer. Pode ser o fim da corrupção, mas pode ser também que muita coisa continue acontecendo por debaixo dos panos. Ou seja, tudo pode mudar para muito melhor, mas pode ser também o pior dos mundos.

Q: COMO FOI TER UMA DE SUAS OBRAS ADAPTADA PARA O CINERAMA PELO MAIS ILUSTRE GRUPO HUMORÍSTICO DO PAÍS?

A: É sempre uma honra ter uma versão de uma obra sua. Nesse caso, então... Eu adro eles, tenho que confessar isso. Mesmo não sendo um grande entusiasta da indústria televisiva, todo domingo à noite eu assisto o programa deles, e me pego sempre dando risadas gostosas, como um molecote, entre uma propaganda e outras dos lençóis Karsten.